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segunda-feira, 20 de agosto de 2012

PREVISÃO DE RETROCESSO NA C&T NO BRASIL

A edição da Revista Sustentabilidade esta semana foi planejada para dar ao leitor um panorama do que foi discutido no 64º Congresso da SBPC no Maranhão no final de julho. No entanto, ao apurar e conversar com alguns dos principais articulistas, a pauta mudou para focar no (eterno) debate do avanço da ciência, tecnologia e inovação no Brasil e os ajustes das conta

 

s públicas. Ou melhor, no permanente desafio frustrado de garantir recursos suficientes para a educação, a pesquisa, o desenvolvimento tecnológico e a inovação.

Antes de começar, em um breve aparte, respondo aos que não entendem o que isso tem a ver com sustentabilidade. Se de um lado a consciência socioambiental depende da educação de qualidade e atual, do outro, a criação de um novo projeto social e econômico que respeite o meio ambiente depende da inovação calcada em pesquisas profundas de novos produtos e processos de produção e sistemas de administração de empresas. Portanto, desvendar o que pensam nossas lideranças científicas é entender o que poderá surgir de novo a favor de uma sociedade mais equilibrada social e ambientalmente.

 

Voltando ao assunto em questão, durante o desenvolvimento da pauta, portanto, dei de cara com dois movimentos principais que aconteceram no Congresso da SBPC e na reunião do Consecti e Confap que aconteceram durante o evento.

 

Resumindo, o Brasil está de parabéns no desenho deu seu sistema de inovação e nas políticas de inclusão social por meio de distribuição de renda. Mas, a preocupação se dá em dois lados. A primeira é a baixa qualidade da educação em todos os níveis, principalmente a educação básica. Estamos colocando crianças nas escolas que continuam esvaziadas de equipamentos e, principalmente, de conhecimento por professores mal pagos e restritos. Por isso, um dos pontos principais levantados pela presidente da SBPC, Helena Nader, é a batalha para aprovação da PEC 94/2011 que garante investimentos de 10% do PIB em educação.

 

A outra proposição contundente neste sentido é colocar recursos das royalties do Pré-sal para a educação e o desenvolvimento da ciência e tecnologia no país. A proposta é alocar 50% destes recursos nestas áreas.

A outra questão levantada no Congresso da SBPC foram os cortes no orçamento da ciência e tecnologia. Pelo segundo ano consecutivo, o congresso ocorreu sob a sombra do ajuste fiscal, de cortes de orçamento para garantir o superávit primário e políticas anticíclicas estimulando as indústrias velhas como as de bens de consumo e de veículos automotivos.

 

Mas, como apontou Odenildo Sena, presidente do Consecti, sem desenvolvimento tecnológico não há inovação e não há soberania nacional. Em 2011 e 2012, o Ministério da Fazenda cortou cerca de 22% do orçamento da ciência e tecnologia e nem mexeu no superávit fiscal – fixado em 3% do PIB e R$138 bilhões só em 2012. De fato, política monetária é um assunto complicadíssimo, principalmente quando o mundo está em uma crise que ora recrudesce e que ora alivia, mas na qual a maioria do mundo está afundada numa quase depressão com altos índices de desemprego e insolvência de países inteiros, sem contar a recente quebradeira moral e financeira dos bancos.

 

O setor acadêmico não está sozinho. O setor produtivo também demanda que o governo não abandone o desenvolvimento do setor de ciência e tecnologia que começou a dar frutos em várias áreas. A Anpei, a CNI, as federações estaduais da indústria já alertaram contra a decisão do governo. O Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp, diz ter ouvido. Mas o governo e o congresso estão parados pelo julgamento do ‘mensalão’ e pelas eleições municipais.

 

Enquanto isso, o mundo não para de girar. Como se para confirmar o erro do governo em abandonar o setor de ciência, tecnologia e inovação, o Brasil apareceu em queda no ranking da inovação por pura falta de inércia, já que outros países continuaram seus esforços. Israel, por exemplo nas primeiras posições da lista, investe 4,2% do seu PIB em pesquisa e desenvolvimento. O Brasil ficou em cerca de 1,2% e pretende, até 2015, chegar 1,8% do PIB, uma meta que já foi mais ambiciosa no passado.

 

Mais uma confirmação de que o Brasil está na contramão nesta área, foi a recente publicação do relatório da Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos, que alerta sobre os perigos do país cair na produção cientifica, tecnológica e inovadora. O relatório mostra que os investimentos vêm caindo e os Estados Unidos hoje conta por 34% em 2010 dos investimentos mundiais em P&D, uma queda em comparação a 39% em 1999. O relatório alerta para os avanços de outros países, inclusive do Brasil, e recomenda subsídios, financiamento e compras governamentais, expansão de mercado no exterior, acordos internacionais, a implementação de políticas de apoio para pequenas empresas e a atração de cérebros estrangeiros. Tudo isso com metas claras, a mais macro sendo a de garantir que os investimentos em P&D cheguem 3% do em 2020, dos cerca de 2,7% atuais (note-se, o dobro do Brasil em termos proporcionais).

 

No final, como explica a matéria de Carlos Orsi da agência Inovação Unicamp, o Conselho concluiu que um governo pró-ativo é essencial para se obter frutos efetivos nesta área.

 

Mas, aqui no Brasil, o superávit primário fala mais alto, ou seja, deixar os mercados financeiro e de capitais calmos tem mais valor que preparar o país para abocanhar as oportunidades que surgem no cenário político e econômico internacional. É bem verdade que o governo tem feito esforços para reduzir o financiamento do déficit fiscal com a queda de juros e é bem verdade que o governo implementou programas consistentes para alinhavar a produção científica com a produção industrial inovadora por meio de políticas bem focadas que levaram mais de uma década para colocar o país na 13ª posição no mundo e produção científica. Mas quando o governo federal retira o apoio financeiro a estas medidas no curto prazo, arrisca retrocesso.

 

Sem o governo dando apoio, o setor produtivo retrai os investimentos em P,D&I enquanto a comunidade científica sente na pele com a redução e a não conclusão de projetos como o bem avaliado Ciência sem Fronteiras, que financia a ida de pesquisadores para o exterior. Como salientou Sena do Consecti, quando estes pesquisadores voltarem, onde que eles vão continuar suas pesquisas se o setor público não tem verba e o setor privado está retraído? Talvez atenderão aos apelos dos americanos por especialistas estrangeiros, e quem os culpará?

 

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