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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

PROJETO INOVADOR COM A UDESC, TRANSFORMA CONCHAS EM MATERIAL PRECIOSO PARA CONSTRUÇÃO CIVIL

Santa Catarina produz uma grande quantidade de mariscos e ostras, mas ainda não tem uma boa solução para as conchas. Os mariscos ou mexilhões geralmente são vendidos pré-cozidos, descascados e congelados e, portanto, as conchas se amontoam nas usinas de beneficiamento. Já as ostras são distribuídas vivas e inteiras, logo as conchas são um problema para restaurantese consumidores finais.

 

Em média, as conchas correspondem a 80% do peso dos mariscos, de modo que a uma produção anual de 13 mil toneladas _ como a de Santa Catarina em 2008 - corresponde um monte de resíduos com mais de 10 mil toneladas. Muitas vezes esses resíduos acabam no lixo comum ou, pior, entulham o litoral e os cursos d’água.

 

Na tentativa de eliminar o problema e ainda gerar uma nova fonte de renda para os maricultores, um grupo de pesquisadoras estudou a viabilidade técnica de transformar esse lixo em matéria prima. A pesquisa foi objeto do mestrado de Michele Regina Rosa Hamestera em Engenharia Mecânica (2010), e do projeto de iniciação científica de Bruna Louise Silva, ambas do Instituto Superior Tupy (IST), com orientação da química Palova Santos Balzer, do IST, e da engenheira química Daniela Becker, da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), ambas com doutorado em Engenharia de Materiais.

 

“As conchas de mariscos e ostras são compostas basicamente por carbonato de cálcio, um mineral empregado como carga de enchimento na produção de compósitos plásticos, como o polipropileno utilizado em embalagens e o PVC de tubulações, conduítes e perfis, usados na construção civil”, explica Daniela. O recurso de adotar carga de enchimento visa reduzir custos, porém a matéria prima utilizada deve ter certas características, de modo a não alterar as propriedades do produto final.

 

O carbonato de cálcio empregado na fabricação de compósitos plásticos normalmente vem de jazidas minerais, mas o estudo das pesquisadoras catarinenses mostrou a viabilidade de usar fontes biológicas: as conchas de mariscos e ostras.

“Obtivemos as conchas em usinas de beneficiamento e em alguns restaurantes, graças ao apoio de técnicos da Empresa de Pesquisa Agropecuária e de Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri)”, acrescenta a engenheira da Udesc. “Desenvolvemos um processo bem simples, sem uso de químicos, apenas com moagem e queima (para retirar restos orgânicos), de modo a viabilizar sua adoção nas próprias usinas de beneficiamento dos mariscos, sem risco de causar poluição”.

Os pós de carbonato de cálcio obtidos têm uma coloração mais cinzenta do que o mineral das jazidas, sendo que o das ostras é mais claro e o dos mariscos, mais escuro. Mas os dois foram aprovados quanto às propriedades técnicas.

Segundo relata Daniela Becker, foram produzidas pequenas peças de polipropileno e PVC com o pó das conchas, depois submetidas a testes mecânicos (tração, torção, resistência) e de temperatura (fusão, cristalização). “Os resultados obtidos mostraram o mesmo comportamento dos compósitos feitos com material comercial, confirmando a viabilidade técnica do processo”, diz. A viabilidade econômica não foi avaliada, mas será o próximo passo, a cargo dos maricultores.

A pesquisa foi realizada no decorrer de dois anos e apenas a aluna de iniciação científica, Bruna Silva, contou com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Santa Catarina (Fapesc). O mestrado foi financiado com recursos particulares.

Em resumo, uma ideia simples, bem pensada e bem testada, pode resultar em uma alternativa inteligente e sustentável de reciclagem de resíduos, gerando até uma fonte adicional de renda para quem trabalha com ostras e mariscos. Nada como uma boa dose de Ciência e Tecnologia para fazer das conchas novos produtos!

Fotos: Michele Hamestera (ao alto: concha de ostra à esq. e de mariscos à dir. e abaixo, da esq. para a dir.: carbonato de cálcio de jazida, de conchas de ostras e de conchas de mariscos) ( fonte: Revista Fapesc e www.projetoconchas.ufsc.br/.../1210425132.PDF)

terça-feira, 21 de agosto de 2012

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E OS 'CÉTICOS' - JOSÉ GOLDEMBERG

 

Por incrível que pareça, estamos atravessando, neste início do século 21, uma onda de obscurantismo cultural e científico sem precedentes. Ela tem origem, principalmente, nos Estados Unidos, mas está se propagando pelo restante do mundo.

 

Ao mesmo tempo que os físicos estão conseguindo desvendar os mistérios da natureza com a descoberta do bóson de Higgs – “a partícula de Deus” -, a cientologia avança nos Estados Unidos e a teoria da evolução de Darwin é questionada nas escolas de vários Estados daquele país.

 

Algumas dessas crenças têm origem em pequenos grupos religiosos retrógrados que exploram a boa-fé de pessoas de baixo nível educacional, mas outras têm, claramente, motivações mais perversas e até interesses comerciais. A cientologia, em particular, é considerada uma religião nos Estados Unidos, sendo, portanto, isenta do pagamento de impostos. Alguns de seus ensinamentos atingem o nível do absurdo ao afirmarem que bilhões de seres de outras galáxias se apossaram dos seres humanos há dezenas de milhões de anos, quando ainda nem havia seres humanos, e continuam neles até hoje.

 

O que elas todas têm em comum, contudo, é o completo desconhecimento do que é ciência. Isso é o que está ocorrendo no momento também com os “céticos” que questionam o fato notório de que a ação do homem está provocando o aquecimento do planeta.

 

As bases científicas do aquecimento da Terra são simples: desde o início da Revolução Industrial, no início do século 19, os seres humanos passaram a consumir quantidades crescentes de combustíveis fósseis – carvão mineral, petróleo e gás natural -, cujo resultado é a produção de um gás, o dióxido de carbono (CO2), que é lançado na atmosfera, onde permanece por um longo período de tempo. Sucede que esse gás é transparente e deixa a luz solar passar, atingindo o solo e aquecendo-o. O normal seria esse calor voltar para o espaço, porém isso não ocorre porque o dióxido de carbono não deixa o calor passar e voltar para o espaço. Com isso, todo o nosso planeta está ficando mais quente, como se verifica numa estufa onde se criam rosas ou vegetais no inverno.

 

Há muitas outras causas conhecidas para o aquecimento global, como as manchas solares, a inclinação do eixo da Terra, as erupções vulcânicas, etc. De fato, ao longo da existência do planeta – que se estende por bilhões de anos – houve grandes variações na temperatura e elas são bem entendidas pelos geólogos.

 

Acontece que, sobrepondo-se a essas causas naturais do aquecimento, existe a ação do homem, que consome combustíveis fósseis e lança gases na atmosfera. Esse fenômeno tem sido estudado por um grande número de cientistas há mais de 50 anos.

 

Para entender o que aconteceu até agora e tentar prever o que vai acontecer nas próximas décadas os cientistas construíram modelos de como o clima da Terra se comporta à medida que o tempo passa e a atmosfera se modifica com mais dióxido de carbono, originado da queima dos citados combustíveis fósseis. Nesses modelos, o que se faz é relacionar causa e efeito, que é a maneira como a ciência funciona. A causa é a presença de maiores quantidades de gases na atmosfera e o efeito, o aquecimento resultante do nosso planeta.

Há incertezas nas previsões científicas, mas com o passar do tempo elas estão ficando cada vez mais confiáveis e precisas. Por exemplo, James Lovelock, ídolo dos ambientalistas por suas ideias sobre a “hipótese Gaia” – que considera a Terra toda com características de um ser vivo -, não questiona a realidade do aquecimento global como resultado da ação do homem, mas sim a necessidade de mais pesquisa sobre o tema.

 

É contra essas evidências que se manifestam os “céticos”, cuja motivação não é clara. Alguns o fazem para atrair a atenção do público e outros podem estar sendo estimulados pelas indústrias que serão prejudicadas caso seja limitado o uso de combustíveis fósseis, que tem sido proposto por vários países.

 

Esses “céticos” não adotam o método científico ao fazerem as suas críticas. Eles simplesmente emitem opiniões e previsões esdrúxulas, como a de que a Terra estaria passando por um processo de resfriamento, em lugar de se aquecer, num futuro que eles não especificam. Cartomantes podem fazer isso, mas não cientistas.

 

Os “céticos”, a maioria deles sem formação científica na área de mudanças climáticas, conseguiram notoriedade nos Estados Unidos publicando artigos no Wall Street Journal (!). Alguns jornalistas mal informados frequentemente dão grande cobertura a essas pessoas porque elas provocam controvérsias que atraem os leitores. Para alguns, é considerado bom jornalismo que “se ouçam os dois lados”, o que é válido para muitos outros assuntos, como, por exemplo, a descriminalização da maconha ou as vantagens da introdução da pena capital para crimes hediondos, em relação aos quais existem opiniões divergentes.

 

Sucede que no caso do aquecimento global não há “dois lados”: o que existe são previsões científicas baseadas na ciência que conhecemos, que podem não ser perfeitas – como é todo o conhecimento científico -, mas têm avançado muito. O “outro lado”, de modo geral, utiliza informações pseudocientíficas, ou simplesmente dúvidas lançadas ao vento que não podem ser respondidas sem uma argumentação científica que não é adequada para programas populares.

 

Opiniões pessoais ou crenças religiosas devem ser respeitadas, mas argumentos incorretos que prejudicam a adoção de políticas públicas importantes – como as de prevenir o aquecimento da Terra reduzindo o consumo de combustíveis fósseis – são perniciosos e não atendem ao interesse público.

 

JOSÉ GOLDEMBERG É PROFESSOR EMÉRITO E EX-REITOR DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP), FOI SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO GOVERNO FEDERAL E DO ESTADO DE SÃO PAULO  - Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo/EcoDebate, 21/08/2012 - http://www.ecodebate.com.br/2012/08/21/mudancas-climaticas-e-os-ceticos-artigo-de-jose-goldemberg/

 

 

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

USP CRIA APARELHO QUE TRATA ESGOTO DOMÉSTICO E METAIS PESADOS

O protótipo tem capacidade para 4,5 litros. Foto: Blog do Mílton Jung

 

A Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP criou o Reator de Leito Ordenado, aparelho que possibilita o tratamento simultâneo do esgoto doméstico e de metais pesados, a exemplo do cobre e do cádmio. O protótipo tem capacidade para 4,5 litros e o reator em escala piloto teria capacidade de cerca de 6m3.

 

De acordo com o engenheiro Gustavo Mockaitis, que participou do estudo para o desenvolvimento do aparelho, a ideia inicial era analisar um processo biológico que tivesse influência na recuperação de metais pesados.  “De início pensamos no tratamento dos efluentes de mineração, as chamadas águas residuárias de drenagem ácida. Trata-se de um líquido que não possui matéria orgânica”, explicou à Exame.

 

A pesquisa tomou rumo diferente após os cientistas perceberem que, nas diversas águas residuárias que possam conter estes metais, as quantidades são muito variáveis. A partir da descoberta, os pesquisadores decidiram utilizar um efluente mais constante, ou seja, com as mesmas concentrações de materiais, principalmente orgânicos. “Passamos a usar o esgoto doméstico sintético onde foram adicionadas, gradativamente, concentrações de cádmio e cobre até onde o reator pudesse tratar o esgoto”, descreveu Mockaitis.

 

Se realizado com um reator convencional de leito fluidificado, o consumo de energia aumenta. Por isso, “desenvolvemos o protótipo de um Reator de Leito Ordenado, mais econômico em termos de consumo de energia. Ele tem algumas configurações semelhantes a reatores convencionais, mas pode ser mais econômico”, revelou o engenheiro.

 

Depois do tratamento, o líquido que sai pela parte superior do reator, possui carga  orgânica baixa e que não chega a ser prejudicial ao meio ambiente, dependendo da extensão da contaminação por metais pesados na água a ser tratada. * Publicado originalmente no site EcoD.

 

 

CFES - NE REALIZA O I SEMINÁRIO NORDESTINO DE EDUCAÇÃO POPULAR E ECONOMIA SOLIDÁRIA

O Centro de Formação em Economia Solidária do Nordeste (CFES-NE) realiza no dia 21 de agosto, o evento “I Seminário Nordestino de Educação Popular e Economia Solidária”, tendo como tema “Educação Popular e Formação de Educadores e Educadoras na Construção da Sustentabilidade”. (Link.: Leia a íntegra em: www.fbes.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=7058&Itemid=1)

 

 

O METABOLISMO SOCIAL DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Metade da população mundial encontra-se hoje em 19 países asiáticos, cujas economias foram estudadas pelo Sustainable Europe Research Institute (Seri) de Viena com base numa pergunta decisiva para o desenvolvimento sustentável: em que consiste o metabolismo que estas sociedades estabelecem com a natureza?

 

Trata-se de saber como são usadas as bases materiais em que se apoia a oferta de bens e serviços que compõem a riqueza de diferentes países. Para isso, são estudados quatro tipos de materiais absolutamente indispensáveis para a vida moderna: biomassa, energias fósseis, minerais e produtos metálicos. São produtos cuja oferta não é infinita e cuja utilização aumenta com a população e a riqueza.

 

O caráter limitado de sua oferta exige que se coloquem duas questões fundamentais quanto ao seu uso: a primeira refere-se à eficiência com que são extraídos da superfície terrestre, transformados, utilizados e, quando for o caso, reutilizados ou reciclados. Nas sociedades contemporâneas, parte cada vez mais significativa das inovações tecnológicas volta-se para a redução da energia empregada na obtenção destes materiais, a diminuição de sua presença nos diferentes produtos e a ampliação das chances de sua reutilização. Este é o objetivo fundamental dos sistemas de inovação focados na sustentabilidade.

 

Mas há uma segunda questão central que não pode ser evitada diante da escassez relativa dos materiais de que depende a vida social: a que finalidade sua utilização se destina? Que grupos sociais são principalmente beneficiados com seu uso? Quais seus efeitos globais sobre o bem-estar da espécie humana?

 

Os 19 países asiáticos estudados pelo Seri compreendem 90% da população asiática (sem contar a Rússia e os antigos componentes da União Soviética) e 20% do PIB mundial. São imensas as desigualdades entre eles, já que na lista estão Japão, Coreia, Israel, Cingapura, mas também China, Índia, Indonésia, Bangladesh, Tailândia e Paquistão. Como é a região de maior crescimento econômico do mundo, seu metabolismo social é uma das mais importantes questões globais da atualidade.

Em 2005, o consumo dessa metade da população mundial exigia que se retirassem da superfície terrestre, anualmente, 18 bilhões de toneladas destes quatro tipos de materiais (biomassa, minérios, metais e combustíveis fósseis). Este total era de nove bilhões de toneladas em 1985. Na época, esses países consumiam 22% dos recursos mundiais, proporção que passa para 31% em 2005. A Ásia é hoje o centro da economia mundial, não só em termos de crescimento econômico e consumo, mas também é a região em que mais se eleva o ritmo de utilização de materiais e energia. E essa utilização é marcada por uma dupla desigualdade, sem cujo enfrentamento é impossível sequer conceber a ideia de desenvolvimento sustentável.

A primeira refere-se à quantidade de materiais utilizada pelos indivíduos e pelas diferentes economias. Enquanto Japão, Cingapura, Israel e Coreia têm média de 11 a 15 toneladas per capita de extração de materiais, Bangladesh não vai além de 1,1, a Índia fica em torno de 2,8, e a China atinge 6,2 toneladas per capita. A média europeia é próxima à dos mais desenvolvidos países asiáticos, e a do Canadá e dos Estados Unidos chega a 25 toneladas per capita. Não há como ampliar a infraestrutura desses últimos países sem que aumentem os materiais de que depende a construção de novas estradas, fábricas, hospitais, bibliotecas, enfim, das condições indispensáveis para o próprio desenvolvimento. Ao mesmo tempo, como imaginar que este uso chegue ao nível dos países desenvolvidos sem exaustão destes recursos?

 

Daí a importância de uma segunda desigualdade, cujas bases são as diferenças de avanço científico e tecnológico entre os países: a mesma quantidade de materiais pode resultar em utilidades muito maiores a depender da maneira e das finalidades com que são empregados. Em outras palavras, a produtividade material das economias é muito variada. No Japão, cada tonelada de material consumida resulta na produção de quase US$ 2,5 mil. Na média asiática, este valor vai pouco além de US$ 500 e na média mundial fica aquém de US$ 650. Sistemas de inovação voltados para a sustentabilidade têm justamente a função de permitir que a mesma unidade de materiais se exprima em quantidade cada vez maior de riqueza. Isto se obtém pela ampliação na própria eficiência com que os materiais são empregados. Aumentar a produtividade dos recursos é, certamente, uma das bases do desenvolvimento sustentável.

 

E neste particular, o trabalho do Seri apresenta duas conclusões preocupantes. Em primeiro lugar, nos países que mais crescem neste conjunto asiático, o uso de recursos acompanha pari passu a própria ampliação na oferta de bens e serviços: o crescimento não se emancipa, não se descola de sua dependência com relação aos bens materiais finitos dos quais ele depende. E a segunda conclusão é que parte da capacidade, que tiveram os países mais ricos de descasar relativamente seu crescimento dessas bases materiais, deriva de avanço científico e tecnológico, mas também do fato de que suas indústrias mais sujas e pesadas foram transferidas para nações mais pobres.

 

O resultado é que, por mais importante que sejam as inovações tecnológicas na emergência do desenvolvimento sustentável, será necessário igualmente discutir a que finalidades e com que benefícios sociais são usados os recursos ecossistêmicos em que o crescimento econômico se apoia. Utilizar ferro, plástico, borracha e vidro para produzir automóveis que congestionam as regiões metropolitanas, e usar terra, adubos e agrotóxicos para oferecer alimentos que resultam em crescente obesidade são formas cada vez menos admissíveis de estimular as atividades capazes de garantir sucesso na luta contra a pobreza. Na raiz das doenças metabólicas das sociedades contemporâneas, está o próprio sentido de suas atividades econômicas.

 

Esses temas serão discutidos por Eduardo Giannetti da Fonseca, Ladislau Dowbor e Matthew Shirts, por ocasião do lançamento de Muito Além da Economia Verde, no dia 20 de agosto, às 19 horas, no Teatro Eva Herz, no Conjunto Nacional, em São Paulo. (*)Ricardo Abramovay é professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) e do Instituto de Relações Internacionais (IRI), ambos da Universidade de São Paulo (USP), pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fapesp, e autor de Muito Além da Economia Verde, lançado na Rio+20 pela Editora Planeta Sustentável.

 

PREVISÃO DE RETROCESSO NA C&T NO BRASIL

A edição da Revista Sustentabilidade esta semana foi planejada para dar ao leitor um panorama do que foi discutido no 64º Congresso da SBPC no Maranhão no final de julho. No entanto, ao apurar e conversar com alguns dos principais articulistas, a pauta mudou para focar no (eterno) debate do avanço da ciência, tecnologia e inovação no Brasil e os ajustes das conta

 

s públicas. Ou melhor, no permanente desafio frustrado de garantir recursos suficientes para a educação, a pesquisa, o desenvolvimento tecnológico e a inovação.

Antes de começar, em um breve aparte, respondo aos que não entendem o que isso tem a ver com sustentabilidade. Se de um lado a consciência socioambiental depende da educação de qualidade e atual, do outro, a criação de um novo projeto social e econômico que respeite o meio ambiente depende da inovação calcada em pesquisas profundas de novos produtos e processos de produção e sistemas de administração de empresas. Portanto, desvendar o que pensam nossas lideranças científicas é entender o que poderá surgir de novo a favor de uma sociedade mais equilibrada social e ambientalmente.

 

Voltando ao assunto em questão, durante o desenvolvimento da pauta, portanto, dei de cara com dois movimentos principais que aconteceram no Congresso da SBPC e na reunião do Consecti e Confap que aconteceram durante o evento.

 

Resumindo, o Brasil está de parabéns no desenho deu seu sistema de inovação e nas políticas de inclusão social por meio de distribuição de renda. Mas, a preocupação se dá em dois lados. A primeira é a baixa qualidade da educação em todos os níveis, principalmente a educação básica. Estamos colocando crianças nas escolas que continuam esvaziadas de equipamentos e, principalmente, de conhecimento por professores mal pagos e restritos. Por isso, um dos pontos principais levantados pela presidente da SBPC, Helena Nader, é a batalha para aprovação da PEC 94/2011 que garante investimentos de 10% do PIB em educação.

 

A outra proposição contundente neste sentido é colocar recursos das royalties do Pré-sal para a educação e o desenvolvimento da ciência e tecnologia no país. A proposta é alocar 50% destes recursos nestas áreas.

A outra questão levantada no Congresso da SBPC foram os cortes no orçamento da ciência e tecnologia. Pelo segundo ano consecutivo, o congresso ocorreu sob a sombra do ajuste fiscal, de cortes de orçamento para garantir o superávit primário e políticas anticíclicas estimulando as indústrias velhas como as de bens de consumo e de veículos automotivos.

 

Mas, como apontou Odenildo Sena, presidente do Consecti, sem desenvolvimento tecnológico não há inovação e não há soberania nacional. Em 2011 e 2012, o Ministério da Fazenda cortou cerca de 22% do orçamento da ciência e tecnologia e nem mexeu no superávit fiscal – fixado em 3% do PIB e R$138 bilhões só em 2012. De fato, política monetária é um assunto complicadíssimo, principalmente quando o mundo está em uma crise que ora recrudesce e que ora alivia, mas na qual a maioria do mundo está afundada numa quase depressão com altos índices de desemprego e insolvência de países inteiros, sem contar a recente quebradeira moral e financeira dos bancos.

 

O setor acadêmico não está sozinho. O setor produtivo também demanda que o governo não abandone o desenvolvimento do setor de ciência e tecnologia que começou a dar frutos em várias áreas. A Anpei, a CNI, as federações estaduais da indústria já alertaram contra a decisão do governo. O Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp, diz ter ouvido. Mas o governo e o congresso estão parados pelo julgamento do ‘mensalão’ e pelas eleições municipais.

 

Enquanto isso, o mundo não para de girar. Como se para confirmar o erro do governo em abandonar o setor de ciência, tecnologia e inovação, o Brasil apareceu em queda no ranking da inovação por pura falta de inércia, já que outros países continuaram seus esforços. Israel, por exemplo nas primeiras posições da lista, investe 4,2% do seu PIB em pesquisa e desenvolvimento. O Brasil ficou em cerca de 1,2% e pretende, até 2015, chegar 1,8% do PIB, uma meta que já foi mais ambiciosa no passado.

 

Mais uma confirmação de que o Brasil está na contramão nesta área, foi a recente publicação do relatório da Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos, que alerta sobre os perigos do país cair na produção cientifica, tecnológica e inovadora. O relatório mostra que os investimentos vêm caindo e os Estados Unidos hoje conta por 34% em 2010 dos investimentos mundiais em P&D, uma queda em comparação a 39% em 1999. O relatório alerta para os avanços de outros países, inclusive do Brasil, e recomenda subsídios, financiamento e compras governamentais, expansão de mercado no exterior, acordos internacionais, a implementação de políticas de apoio para pequenas empresas e a atração de cérebros estrangeiros. Tudo isso com metas claras, a mais macro sendo a de garantir que os investimentos em P&D cheguem 3% do em 2020, dos cerca de 2,7% atuais (note-se, o dobro do Brasil em termos proporcionais).

 

No final, como explica a matéria de Carlos Orsi da agência Inovação Unicamp, o Conselho concluiu que um governo pró-ativo é essencial para se obter frutos efetivos nesta área.

 

Mas, aqui no Brasil, o superávit primário fala mais alto, ou seja, deixar os mercados financeiro e de capitais calmos tem mais valor que preparar o país para abocanhar as oportunidades que surgem no cenário político e econômico internacional. É bem verdade que o governo tem feito esforços para reduzir o financiamento do déficit fiscal com a queda de juros e é bem verdade que o governo implementou programas consistentes para alinhavar a produção científica com a produção industrial inovadora por meio de políticas bem focadas que levaram mais de uma década para colocar o país na 13ª posição no mundo e produção científica. Mas quando o governo federal retira o apoio financeiro a estas medidas no curto prazo, arrisca retrocesso.

 

Sem o governo dando apoio, o setor produtivo retrai os investimentos em P,D&I enquanto a comunidade científica sente na pele com a redução e a não conclusão de projetos como o bem avaliado Ciência sem Fronteiras, que financia a ida de pesquisadores para o exterior. Como salientou Sena do Consecti, quando estes pesquisadores voltarem, onde que eles vão continuar suas pesquisas se o setor público não tem verba e o setor privado está retraído? Talvez atenderão aos apelos dos americanos por especialistas estrangeiros, e quem os culpará?

 

OS SIGNIFICADOS DA SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL PARA O CONSUMIDOR

No momento em que líderes do mundo inteiro se reúnem para discutir o desenvolvimento sustentável, alguns questionamentos emergem como primordiais ao debate: até que ponto falamos a mesma língua quando nos referimos ao termo sustentabilidade? No que tange especificamente ao mundo dos negócios, o que os consumidores entendem por atuação sustentável das empresas? Na perspectiva da demanda, existe convergência entre as formas de definir e de mensurar a sustentabilidade empresarial?

Para as empresas, compreender o que os consumidores entendem por atuação sustentável é essencial para o sucesso das políticas de sustentabilidade.

Afinal, de nada adiantará o exercício de incorporar a sustentabilidade como princípio norteador da gestão se a mensagem transmitida não é legível ao consumidor. Ou, tão preocupante quanto, se as principais frentes de atuação escolhidas pelos gestores dialogam pouco com as maiores expectativas da demanda.

Considerando que grande parte das corporações brasileiras opera não apenas no território nacional, é também importante analisar as diferenças de percepção entre os diversos mercados.

Tomando-se como exemplo uma empresa nacional, engajada em diversas frentes de atuação sustentável, cujos consumidores estão no Brasil e em outros países, seria possível utilizar apenas uma tática de comunicação da política de sustentabilidade da organização? Provavelmente não.

A menos que haja um consenso quanto ao que se espera de uma empresa sustentável entre brasileiros e estrangeiros, o que é extremamente raro, a comunicação necessita adequar-se à cultura de cada mercado.

Como pré-requisito para pensar na adequação da comunicação sobre sustentabilidade empresarial à forma como os consumidores enxergam e aos seus focos de expectativas, as empresas precisam de uma atuação sustentável multifacetada. É justamente essa diversidade de ações que ajudará os comunicadores a ajustar as mensagens veiculadas de acordo com as necessidades de cada mercado. Mas isso não pode implicar uma perda de identidade empresarial, conflito de princípios organizacionais ou – uma decorrência natural quando as iniciativas batem de frente com a percepção daquilo que a empresa deveria priorizar em função do seu impacto – o aumento do ceticismo da demanda.

Desde 2001, o Monitor de Sustentabilidade Corporativa da Market Analysis contribui para o alinhamento das políticas de atuação sustentável das empresas com as percepções, opiniões e comportamentos dos consumidores. Neste Dossiê Verde, discorremos sobre uma das principais investigações do MSC 2012: as formas pelas quais os consumidores definem o tema da sustentabilidade empresarial e quais parâmetros a demanda utiliza para mensurar a atuação sustentável.

 

 

 

 

 

 

 

 

Critérios utilizados pelos consumidores para definir sustentabilidade empresarial

 

Como o consumidor brasileiro define a atuação sustentável das empresas? Até que ponto os mercados estrangeiros convergem com o nacional?

Ao redor do mundo, cinco formas de definir a sustentabilidade empresarial predominam: preservação ambiental, políticas internas, qualidade de produtos e serviços, contribuição à economia nacional e ética.

No Brasil, a sustentabilidade corporativa é sinônimo de preservação ambiental, uma visão compartilhada por outros três grandes mercados: Canadá, Índia e Austrália.

Com certeza não se trata da única definição dos brasileiros sobre o tema nem que seja conceituada assim para todos os setores da economia por igual, mas representa a que congrega um número maior de opiniões entre os consumidores.

Já o conceito de uma empresa sustentável como aquela que implementa boas práticas de políticas internas predomina entre estadunidenses, franceses, alemães, britânicos e russos, além de mexicanos, peruanos e chilenos.

O quanto a corporação contribui para a economia nacional é o foco dos africanos, espanhóis, gregos, indonésios e sul-coreanos. Já os chineses e paquistaneses definem a partir dos produtos e serviços, enquanto argentinos e turcos se voltam para a ética.

Em termos de geografia e de blocos econômicos, apenas duas convergências de destaque quanto à forma de definir sustentabilidade empresarial: 1) os africanos entendem a atuação sustentável das empresas a partir do quanto elas contribuem para as economias nacionais, uma evidência de que esses consumidores enxergam as corporações como protagonistas do desenvolvimento do continente; 2) os europeus se baseiam essencialmente no tema do trabalho e da geração de renda, seja através da ênfase na qualidade de vida proporcionada aos colaboradores, como na Alemanha, França, Reino Unido e Rússia, ou por meio do quanto as empresas agregam valor à economia, como na Grécia e na Espanha.

 

 

Ao aprofundar-se sobre a conceituação brasileira, percebe-se que os consumidores utilizam principalmente duas referências para definir sustentabilidade corporativa: preservação ambiental (39%) e ações sociais (27%). Juntas, essas frentes de atuação representam66% da definição de empresa sustentável. Com peso moderado, surgem as políticas internas (15%) e a contribuição à economia nacional (8%). Por fim, aparecem, com pouca saliência, a governança corporativa (3%), a qualidade dos produtos e serviços (2%), o patrocínio esportivo (1%) e a gestão e imagem (1%).

 

Ao se observar o principal patamar da definição dos consumidores brasileiros, formado pela preservação ambiental em primeiro lugar e pelas ações sociais em segundo, poderia se supor que há uma forte alusão aos temas centrais da Rio+20, economia verde e erradicação da pobreza, respectivamente.

Contudo, a ideia de uma proposta macroeconômica que possua como princípio norteador o desenvolvimento da nação associado à manutenção dos ecossistemas e dos recursos naturais ainda permanece fora do radar de compreensão dos brasileiros, principalmente porque o público não consegue conectar os pontos, isto é, formar uma visão sistêmica sobre a sustentabilidade, premissa básica para assimilar o conceito de economia verde.

Ainda, esta visão que privilegia apenas dois terços do triple bottom line pode acarretar dificuldades na hora de compreender os impactos socioambientais de projetos que prezem pela alavancagem econômica, tais como o Pré-Sal.

 

De outra parte, as ações sociais sugeridas pela demanda remetem muito mais à ampliação da disponibilidade de serviços básicos ao cidadão, como saúde, educação e moradia, do que à ideia de erradicar a pobreza do Brasil ou do mundo. Talvez pelo bom momento econômico que o país tem vivido nos últimos anos, a pobreza sensibiliza menos os brasileiros hoje em dia do que no passado.

A definição de empresa sustentável no Brasil tem se ancorado cada vez mais no pilar ambiental: se, em 2005, 9% do público indicava a preservação do meio ambiente como principal ação de sustentabilidade corporativa, hoje essa fatia já representa 39% dos brasileiros. De 2005 a 2010, as ações sociais ganharam força, formando uma díade conceitual composta pelos pilares da sociedade e do meio ambiente. Contudo, desde 2010, o pilar social perdeu terreno e hoje a tendência é a de uma única frente dominante de definição.

 

 

Além da tendência de predominância da preservação ambiental como sinônimo de sustentabilidade empresarial no Brasil e da perda de saliência das ações sociais, o brasileiro também dá outros sinais de mudança na forma de definir o tema:

 

a) um dos pilares mais fortes nas definições ao redor do mundo, as políticas internas voltam a ganhar espaço no Brasil, desde 2010;

b) a contribuição à economia nacional não parece mais ter forças como um atributo determinante de atuação sustentável, como tinha até 2008, uma vez que após grande queda, em 2010, estabilizou-se desde então;

c) de forma distinta do que ocorre nas discussões entre especialistas sobre sustentabilidade, os temas dagovernança corporativa, da gestão e da qualidade se tornam cada vez mais secundários na definição dos consumidores brasileiros.

 

Seria possível imaginar que a qualidade dos produtos, bastante tangível aos consumidores, desempenhasse o papel de protagonista na hora de identificar o que uma empresa sustentável de fato faz. No entanto, o que se observa, na prática, é uma queda do peso desse atributo, desde 2005, quando chegou a ser citado por 11% do público e hoje reflete a opinião de uma pequena minoria (2%). Trata-se de um retrato da desvinculação, em grande medida prejudicial ao movimento de sustentabilidade corporativa no Brasil, entre atuação sustentável da empresa como um todo e a avaliação da qualidade (inclusive se sustentável ou não) do produto. Esse quadro também revela a falta de conexão na mente dos consumidores entre a atuação ambiental das empresas e o ciclo de vida dos produtos, uma vez que o atributo qualidade surge desvinculado da cobrança por boa performance eco friendly.

 

Um dos fatores determinantes na forma de definir sustentabilidade empresarial é o grau de informação do consumidor brasileiro sobre o tema. Segmentamos o público em dois grupos, os informados e os desinformados, e analisamos como cada um define a atuação sustentável das empresas.

A definição de atuação sustentável varia conforme o grau de exposição às propagandas e notícias sobre o tema: a) entre os informados, o tamanho da brecha entre a preservação ambiental e as ações sociais é muito maior do que entre os desinformados; b)desinformados mencionam mais ações sociais e contribuição à economia nacional. Esses resultados revelam um ponto crítico: o desafio da comunicação e da educação para a sustentabilidade no Brasil é grande, na medida em que se observa que a ideia de que “sustentável” equivale a “eco-friendly” é ainda mais forte entre os informados.

 

Outra segmentação realizada revelou mais uma peculiaridade brasileira: de um lado, os que definem sustentabilidade a partir da preservação do meio ambiente; de outro, os que o fazem a partir de ações sociais. Qual dos dois públicos é mais interessado?

Os consumidores que definem a atuação sustentável empresarial como sinônimo de atuação proambiental estão consideravelmente mais interessados do que os que o fazem como sinônimo de ação social. De forma geral, o volume de interessados pelo tema no Brasil, neste ano, é de 68%, mas essa fatia salta para 77% se tomarmos como foco de análise apenas os que definem a partir do pilar ambiental, e cai para 59% quando se considera apenas os que conceituam a partir das ações sociais.

Essa é uma prova de que as ações ambientalmente amigáveis possuem um papel determinante na receptividade do público brasileiro em relação ao assunto. A mensagem de que a sustentabilidade empresarial envolve múltiplas frentes de atuação deve ser veiculada, porém não é aconselhável negligenciar que o pilar ambiental alavanca o interesse dos consumidores.

Esses resultados indicam uma forte expectativa por mais e melhores projetos ambientais, mas isso está longe de representar um convite aberto ao greenwashing. Afinal, os mais informados são justamente os primeiros a descobrir tentativas de maquiar ou forçar uma imagem verde sem respaldo. Para as empresas oportunistas, o caminho da maquiagem verde pode até parecer promissor.  Porém, em um contexto de fluxo de informações intenso nas redes sociais, o qual praticamente acompanha a velocidade da luz, o mais oportuno é ser transparente.

 

Analisando a convergência entre as formas de definir e de mensurar a sustentabilidade empresarial

 

Se o consumidor brasileiro define a atuação sustentável das empresas em primeiro lugar com base em ações de preservação, em segundo de acordo com ações sociais e, em terceiro plano, a partir do quanto a empresa oferece boas condições de trabalho para os seus colaboradores, espera-se que esses mesmos critérios sejam usados no momento de avaliar uma corporação em sustentabilidade.

 

 

 

 

 

 

Ainda, se apenas Brasil, Canadá, Índia e Austrália colocam o pilar ambiental como principal eixo conceitual de sustentabilidade empresarial, também se supõe que os brasileiros estejam acima da média mundial em relação ao uso da atuação proambiental como critério de julgamento da performance das empresas. Essas hipóteses se confirmam na prática?

O quanto uma empresa preserva o meio ambiente se constitui no principal driverde apoio da atuação em sustentabilidade no mercado brasileiro. Esse é um quadro restrito às fronteiras nacionais, uma vez que, ao redor do mundo, a qualidade dos produtos e serviços, a gestão e imagem, e as ações sociais possuem maior peso de impacto sobre a avaliação que os consumidores fazem acerca da atuação sustentável das empresas.

Pode-se ainda afirmar que, entre os brasileiros, o que uma corporação faz no pilar ambiental repercute na sua avaliação tanto quanto o conjunto de ações sociais, políticas internas e qualidade de produtos e serviços.

Esse resultado confirma ambas as hipóteses descritas anteriormente: 1) o núcleo da definição brasileira (preservação ambiental, ações sociais e políticas internas) se transforma na principal plataforma de apoio das empresas tidas como melhores exemplos em sustentabilidade; 2) o peso que os brasileiros atribuem ao pilar ambiental supera em mais de quatro vezes a média mundial.

Até que ponto os critérios usados pelos consumidores brasileiros para julgar a sustentabilidade das empresas se assemelham aos encontrados entre os outros países do BRIC? Há mais diferenças ou semelhanças entre emergentes e desenvolvidos?

O alinhamento entre Brasil, Rússia, Índia e China se dá até certo ponto, e não permite falar em uma atitude homogênea dos consumidores oriundos dos BRICs. Chineses, indianos e russos apresentam certa convergência ao se alinhar à média mundial e utilizar como principais parâmetros a qualidade dos produtos e serviços e a gestão das empresas.

Na China, aliás, além de uma empresa sustentável normalmente ser definida com base na qualidade dos seus produtos e serviços, esse também é o atributo que mais determina o apoio aos bons exemplos.

Na Índia, como a empresa se comporta em termos de gestão e imagem constitui-se no principal driver de apoio, apesar de a preservação ambiental ser base de definição de corporação sustentável. Já na Rússia, a qualidade dos produtos e a gestão possuem pesos equivalentes.

Entre os quatro países desenvolvidos analisados, a divergência é considerável e bem maior do que a encontrada entre os BRICs. Os franceses concordam em certa medida com os brasileiros ao utilizar como parâmetro para avaliar a atuação sustentável o quanto as empresas preservam o meio ambiente.

Na Alemanha, o principal foco está nas políticas internas. Já no Reino Unido, a gestão e a imagem determinam mais o apoio aos bons exemplos. Os estadunidenses, por sua vez, utilizam mais as ações sociais como principal critério. O curioso é que, nos países desenvolvidos em análise, à exceção da Alemanha, os consumidores não utilizam como parâmetro de avaliação da atuação sustentável o seu principal conceito – as políticas internas.

Isso provavelmente ocorre pela dificuldade que parte da demanda enfrenta em observar como de fato as empresas se relacionam com os seus colaboradores, fazendo com que seja necessário utilizar outros parâmetros de avaliação mais acessíveis.

Esse quadro diverso das plataformas de reputação sustentável ao redor do mundo revela que as empresas do business to consumer (B2C) em escala internacional necessitam de uma estratégia de sustentabilidade empresarial realmente multifacetada.

Isso permite às organizações dialogar com consumidores que possuem métricas distintas para avaliar a atuação sustentável. Prova de que é arriscado apostar a maior parte dos investimentos na preservação de uma mata nativa brasileira, por exemplo, alcançando boa reputação na esfera nacional, e querer levar essa imagem de empresa sustentável para outros mercados ao redor do mundo.

As empresas precisam estar alertas, ainda, a mais um grande obstáculo na busca pelo alinhamento das políticas de sustentabilidade com as demandas dos seus clientes: a brecha existente no discurso dos consumidores entre a forma como o tema é definido e os critérios utilizados na hora de julgar a atuação corporativa sustentável.

Se nem entre os formadores de opinião sobre o assunto há convergência entre o conceito de sustentabilidade e a forma de mensurar a atuação sustentável das empresas, a incoerência dos consumidores pode ser considerada previsível.

Comparamos o cenário brasileiro com o mundial quanto à relação entre formas de definir e de avaliar a atuação sustentável. O tamanho da dissonância encontrada no Brasil é menor do que a verificada ao redor do mundo: quanto mais o consumidor brasileiro se utiliza de uma frente de atuação para definir o que é sustentabilidade empresarial, mais ele tende a usar essa mesma frente como parâmetro de avaliação de empresas.

Isso vale principalmente para preservação ambiental, ações sociais e políticas internas. Apenas quanto à contribuição da empresa para a economia nacional há uma discrepância entre o uso dessa frente como sinônimo de atuação sustentável e a utilização como parâmetro de avaliação: 8% dos consumidores a mencionam no momento de definir sustentabilidade empresarial, mas ela não é utilizada como motivo de avaliação positiva.

Ainda, aqui também fica evidente o descompasso na mente dos consumidores brasileiros entre a cobrança por atuação ambiental e por maior sustentabilidade da produção: enquanto a preservação da natureza está no foco da demanda, a qualidade dos produtos é secundária.

 

O QUADRO GLOBAL É RAZOAVELMENTE DISTINTO

Uma frente muito utilizada para definir atuação sustentável não necessariamente é aproveitada quando se busca uma avaliação da performance das empresas.

Com exceção das ações sociais, bastante usadas tanto na definição como na avaliação, e do patrocínio esportivo e cultural, pouco lembrado em ambas as dimensões em análise, todas as outras frentes apresentam resultados dissonantes.

Essa dissonância entre as formas de perceber e de avaliar a atuação sustentável é mais uma característica da opinião pública sobre sustentabilidade empresarial.

Para as empresas inovadoras, há espaço para ganhos futuros: na medida em que uma corporação consiga partir do mesmo patamar conceitual da demanda e instrumentalizar o consumidor com indicadores convergentes com o conceito predominante e que lhe sejam legíveis e tangíveis, a redução dessa brecha pode ocorrer e trazer ganhos de reputação.

Os resultados do MSC ao longo da última década demonstram que, quando os consumidores sabem identificar frentes específicas de atuação, eles tendem a recompensar mais as empresas, apontando-as como exemplos de sustentabilidade, comprando seus produtos e divulgando uma imagem favorável nos círculos sociais.

O terreno das percepções dos consumidores sobre sustentabilidade empresarial é realmente sinuoso. Contudo, a opinião pública brasileira demonstra menor contradição em seu discurso quando comparada ao resto do mundo, o que torna mais fácil a comunicação e a educação para a sustentabilidade no Brasil. Para as empresas que possuem consumidores em outros países, o desafio é o da adequação do foco da comunicação, mas para isso é preciso haver uma atuação sólida e multidimensional que subsidie tal estratégia.

Para que as mensagens veiculadas não sejam encaradas como oportunistas pelos consumidores, um dos melhores caminhos é o da comunicação de projetos específicos, de preferência com resultados tangíveis. Essa tática melhora a receptividade, diminui o ceticismo, alavanca a reputação sustentável e favorece as recompensas em termos de compra e de propaganda boca a boca.

 

Na comunicação para a sustentabilidade junto ao público brasileiro, a atuação ambiental sensibiliza como nunca. A projeção é a de que a predominância desse pilar aumente no próximo ano, considerando que 2012 é o momento da Rio+20. Trata-se de uma oportunidade ímpar para as corporações ampliarem o engajamento com o desenvolvimento sustentável, enfrentando a pendência da educação sobre o caráter sistêmico da sustentabilidade.

As empresas têm grande potencial e alcance de comunicação, podendo se comprometer com a informação sobre a relação entre aspectos econômicos e ambientais, por exemplo, e favorecendo, assim, a proposta de uma economia verde.

A Market Analysis é um instituto de pesquisas especializado em sustentabilidade e responsabilidade social, parceiro de Ideia Sustentável na produção de conteúdos para os Dossiês e análises de tendências, bem como na realização de pesquisas customizadas e gestão de conhecimento para empresas clientes. (FONTE: